E-mail: a melhor rede social do mundo

Mais um texto de 2015. Até agora está sendo interessante reler estes escritos e perceber o que mudou e o que não mudou. O mais difícil, porém, é não julgar o que eu pensava ou a maneira como eu escrevia ou desenhava.

Há alguns anos eu tinha uma verdadeira preguiça em usar e-mail, mas eu invariavelmente tenho preguiça pelas coisas antes de conhecê-las mais a fundo. Quando acabo conhecendo, por vezes me empolgo tanto com a descoberta da utilidade delas na minha vida que as pessoas ficam sem entender o motivo de toda minha euforia. Deve ser porque ao contrário do que esperam de uma virginiana e de um ISTJ (ou INTP-T, whatever), eu sou bastante desorganizada. Então, qualquer ferramenta que eu consiga adaptar à minha vida e me ajude a ter o mínimo de controle sobre minhas tarefas eu estou abraçando (ou ao menos tentando). Tenho uma amiga, virginiana também, a próposito, com cerca de 10 anos a menos do que eu que fica simplesmente indignada com o fato de eu ainda usar e-mail. Dias atrás, um dos slides da aula de marketing na faculdade descrevia que a geração Z considerava o e-mail como old-fashioned e, apesar de eu odiar marketing e não levar quase nenhuma dessas ideias a sério, a indignação dela fez um pouco mais de sentido pra mim.

Apesar de ser considerado por muita gente apenas mais uma coisa dentre tantas que precisamos ter para nos cadastrarmos em qualquer lugar, sejam elas redes sociais ou para conseguir alugar uma casa — como um RG — , eu encontrei meu amor há alguns anos quando meu companheiro passou a se comunicar cada vez mais comigo por e-mail. Provavelmente isso aconteceu com a decadência e anunciado fim do MSN, e como estávamos com pouco tempo de relacionamento, tínhamos que achar outras alternativas de nos comunicarmos, já que cada um morava em cantos extremos da cidade. Atravessar São Paulo de ônibus nunca foi uma coisa muito rápida. Por causa disso, sem perceber passei do estado de quase nem lembrar o meu próprio endereço, até ser uma das primeiras coisas que eu faço no dia. Hoje quando estou no computador, eu abro meu e-mail antes de qualquer outra rede social e algumas vezes ainda meio dormindo enquanto ainda estou sentada no banheiro (informação demais, eu sei). Meu e-mail fica aberto o dia todo e durante todo o tempo que estou conectada na internet via wi-fi, e só não no smartphone porque não sou das pessoas adeptas ao 3G (caro demais, lento e uma telinha minúscula que me irrita, não obrigada). Em contrapartida, apesar do vício assumido, algumas outras redes sociais eu uso esporadicamente, ou simplesmente “sumo” por tempo indeterminado quando estou de saco cheio do mundo. Até porque algumas delas não contribuem em nada para manutenção da minha saúde mental ou porque eu realmente canso de ficar tão exposta o tempo todo. Ok, você pode até me dizer que e-mail não pode ser considerado bem uma rede social, mas vejamos como eu uso meu próprio e-mail:

Eu tenho uma série de amigos que eu me comunico quase que exclusivamente por e-mail, quando não pessoalmente. Alguns se conhecem entre si, outros só sabem da existência destes outros pelo endereço de e-mail, alguns são amigos dos amigos. Há amigos que são ex-metaleiros, outros são ex-otakus, ou os dois ao mesmo tempo. Não seria mais prático então usar uma lista e-mails? Uma lista de e-mails não daria exatamente certo no nosso caso. Por que dentro deste minúscula rede, há os que gostam de humor mais rebuscado, meio Monty Python, outros são viciados em gifs animados encontrados no Imgur. Tem também os que são verdadeiros, e num ótimo sentido, Social Justice Warriors e outros que apesar de pessoas muito legais, têm outras prioridades. Ou seja, somos muito diferentes e nossos e-mails são escolhidos e enviados exatamente para as pessoas que queremos, porque o que pode ser interessante para um, não faria muito sentido para o outro. Isso é o que é mais bacana, nós nos conhecemos minimamente, (e alguns é minimamente mesmo), mas já é suficiente para sabermos que não seria bacana mostrar aquele vídeo sobre sei lá, os males da indústria da carne, para um amigo que é vegano e que pode se sentir mal vendo aquilo. Não existe uma timeline única que você vez ou outra pode se deparar com alguma coisa bem desagradável. Não existem pessoas que invadirão a sua página para falarem o que bem entenderem contra o que você está compartilhando. Não existem insultos ou assédios por inbox. Não existe a cobrança de você estar ali todos os dias, “batendo ponto”, porque o compartilhamento de ideias é espontâneo. Não se tenta medir a sua saúde mental, emocional pela quantidade de vezes que você ficou online. E apesar disso tudo, existe a discussão de tópicos, a troca de informações, a desconstrução, o entretenimento e a possibilidade real das pessoas escolherem com quem e quando vão compartilhar, o que as vezes é bem difícil de controlar nas redes sociais mais comuns. O mais importante de tudo é que na nossa pequena rede social temos respeito um pelos outros, por suas particularidades e pensamentos e aprendemos muito escutando uns aos outros, independente do assunto que estiver correndo. E claro, nos divertimos muito também.

Este texto e estes pontos nem podem fazer sentido para você, você pode continuar achando (e tem todo o direito disso!) o e-mail uma coisa velha demais, chata demais, etc. Mas para meu ser introvertido, neurótico pelo controle de privacidade, e avessa a algumas cobranças, o e-mail ainda é para mim, A Melhor Rede Social do Mundo™.

Texto publicado originalmente em: 3 de Outubro de 2015 no Medium.