Aniversário, vacina e tudo mais
Tomei a vacina. A ansiedade era grande, tanto que acabei tomando um dia antes do calendário certo por um erro meu... era pra tomar no dia do meu aniversário. A junção desses dois fatos mexeu um pouco com meu tico e teco, e acho que vou escrever um pouco sobre isso (e muito mais) para me distrair um pouco dessa ansiedade.
Faz 490 dias desde que foi decretado o primeiro “lockdown” por aqui, e não foi fácil para a imensa maioria das pessoas... e ainda não é para muitas outras. Avalanches de notícias e informações assustaram muitos, e como sociedade não sabíamos bem como lidar. O mundo tentava entender o que estava começando e se voltando para quem pudesse responder: profissionais, especialistas e pesquisadores em saúde, biologia, medicina, e etc. O mundo se voltou para as pessoas que trabalham diretamente com ciência e ou que dela fazem uso em suas práticas diárias. Esforços enormes foram feitos por esses, que salvaram muitas vidas. Esforços que resultaram na vacina que está no meu braço e no de outros milhões aqui e no mundo, e que espero que esteja no braço de muitos mais logo em breve.
Mas todo esse esforço e conhecimento sobre o que deveríamos fazer não foi o suficiente para nós e parece que nunca será. “Poderíamos ter feito mais, poderíamos de feito melhor”, acredito que essa deva ser a máxima, fazer sempre o melhor e mais. Mas muitos de nossos governantes, políticos, empresários e pessoas influentes trabalharam para ir no caminho contrário de todo esforço e conhecimento realizado por profissionais e comunidades sérias. Mentiram, desinformaram e mataram muitos de nós... sem eles a tragédia já seria grande, mas eles fizeram questão de deixar ainda maior. Muitos dos que não perderam suas vidas perderam empregos e sustento, esses poderiam também ter sido menos prejudicados se não estivéssemos envoltos nessa espiral de contaminação gigante.
É difícil, eu perdi amigos muito queridos, amigos meus perderam amigos e parentes próximos... sinto dor e choro por saber que não poderei mais abraçá-los. Eles poderiam ter tomado a vacina antes, eles poderiam estar num país onde o governo não incentivasse o contágio da população, não desinformasse e usasse o ódio, o medo, o sentimento de muitos a favor deles e da contaminação. Eles poderiam estar com seus amigos e entes queridos hoje.
Viver momentos históricos não é fácil, muitas vezes nem é perceptível, e certamente esse é um desses momentos. No futuro nossos erros como sociedade ficarão mais claros, os responsáveis por tantas mortes ficarão nos registros e no imaginário de nossos descendentes. Só espero que possam aprender com nossa história, pois infelizmente parece que nós não aprendemos.
Sei que nossas vidas não são pautadas em todos os momentos pelo que é ciência, por um saber que nem sempre é fácil de explicar e que pode entrar em conflito com outros saberes, outros discursos, sentimentos e crenças. Convivi com pessoas dentro da área de educação que eram formadas em áreas da saúde e que por não saberem como funciona uma vacina discursavam que essas poderiam fazer mal, que era um excesso de remédio, que o “natural” é melhor. Um discurso que eu achava perigoso, potencialmente criminoso e que é base de discurso antivacina, anticientífico... e isso acaba valendo para muitas outras pessoas e para muitos outros assuntos, não só vacinas. Somos regidos por nossas vivências, nossas experiências próximas, nossas relações pessoais e profissionais, sentimentos que cultivam em e perto de nós, e se isso por vezes se choca com um saber novo, que questiona e/ou confronta o que acreditamos até então ser o certo, nós fechamos os olhos e muitas vezes agimos contra. É assim, e infelizmente continuará sendo assim... e é por isso que comunicação científica é difícil, e por muitas vezes não é valorizado.
Mas apesar de todos esses vieses que possuímos, o trabalho científico tá aí... salvando vidas e indo parar no braço de muitos. Espero que esse trabalho continue, pois com certeza ainda vamos precisar muito dele.
Cada parágrafo aqui daria para destrinchar em textos enormes sobre o que aprendi, senti e vivi nesses 490 dias..., mas não consigo mais. Só quero que todos tomemos vacina e que “tudo isso logo acabe”.