Apenas um dia no Rio de Janeiro

A cabeça latejava de dor, a boca implorava por gotas de água e o pensamento já não sabia o caminho de casa, mas alguém resolveu me acordar.

Eu não fazia ideia de onde eu estava, quem estava falando isso e qual era o churrasco citado, mas tentei levantar e me arrependi profundamente.

Mas esse é quase o final da história.

As 11h e pouco eu chego no Aeroporto do Galeão, na dita cidade maravilhosa, que mesmo vivendo um eterno fim do mundo, continua linda. Eu tinha que ir pra Niterói. “Só pegar a barca que a gente vai tá lá esperando” disse Dico, a prova viva que não se deve confiar em ninguém de São Gonçalo.

E lá estava eu, na barca, atravessando a Baía de Guanabara. O dia tava bonito e agradável, apesar de um pouco quente demais pro meu gosto. Ouvindo música nem deu pra ver o tempo passar. Cheguei onde disseram pra eu estar.

Sai para uma pequena praça que ficava entre a saída das barcas e a rua. Procurei os dois que disseram estar me esperando por ali, mas não os encontrei. Não estava surpreso, sabia que nada seria tão simples, mas após não achá-los mesmo ligando e mandando mensagem, comecei a me preocupar.

Até que os avisto. Sentados, na mureta de uma arvore. Cada um com um netbook (aqueles notebooks menores) no colo. Super normal.

A primeira coisa que pensei era que estavam fazendo alguma nerdice. Jogando algo ou sei lá, escrevendo códigos. Antes de que conseguisse adivinhar, me aproximei, cumprimentei eles e logo pedi o que estava acontecendo.

Mais algumas perguntas e pronto. As senhorinhas foram felizes oferecer mais chocolate enquanto Dico e Cambs seguravam orgulhosos seus prêmios. Prontos, saímos dali pra pegar um ônibus pra sei lá onde.

Até então eu não sabia onde íamos, onde eu ia ficar, se havia algum planejamento. Eu só sabia que estava no Rio para o aniversário de um amigo. Vamos chamá-lo de Love. Mas era surpresa, então ele ainda não sabia que eu ia dormir na casa dele.

Andamos um pouco e chegamos no apartamento de um amigo do Dico. Tomamos uma água, fumamos um cigarro, comemos os chocolates ganhos em troca de opiniões sobre fluidos industrializados. Tudo certo para fazer a pergunta:

Então era isso, pegar a parada e almoçar, show. Vamo lá.

Pegamos sei lá qual ônibus e fomos parar em sei lá onde. Era um prédio, falamos com o porteiro e subimos. Elevador, oitavo andar e tals. Chegamos e campainha.

Era a mãe do tal amigo, vamos chamá-lo de Ted. Uma das pessoas mais simpática e educada que já vi na vida. Nenhum de nós três conhecia ela mas nos tratava como se fôssemos da família. Fritou mais bifes e botou água no feijão, além de pegar mais cadeiras para por a mesa.

O plano era só passar pegar a tal parada, mas quando vimos já estávamos com almoço servido. Ninguém reclamou. Cambs até pediu se podia comer o último bife. E comeu mesmo. E logo após, mãe de Ted pediu se ele estava com sono e se queria deitar, que ela ajeitava a cama. Ele se sentiu confortável o suficiente pra aceitar.

Ficamos lá, matando um tempo e jogando Fifa de barriga cheia, quando finalmente Ted veio com a parada que fomos buscar.

E foi isso. Fomos buscar maconha e saímos de lá com almoço e até uma descansadinha pós-refeição. Voltamos pro primeiro ap e acendemos o sambarilove.

Fuma um, fuma dois, se o terceiro rolou eu nem lembro. Começando a escurecer, lembramos do aniversário. Conversamos com o resto do pessoal, marcamos de se encontrar na Lapa, a surpresa já tinha ido pro espaço pois ninguém aguenta ficar com a boca fechada. Começamos a nos arrumar pra ir.

Eu nem respondi mais, só conseguia rir da falta de noção. Cambs ainda estava derrotado tentando se levantar do sofá. Dico ainda tentava me convencer de que aquilo era uma boa ideia, pois ia ter whisky a vontade. Jamais confie numa pessoa de São Gonçalo.

Dico pegou um uber pra festa e nos deixou no terminal de ônibus. Antes de nos deixar, lembrou:

Eu e Cambs nos olhamos com aquela certeza de que iríamos nos lembrar. Entramos no terminal, pagamos a passagem e fomos em direção aos ônibus. Ao se aproximar, nos e olhamos e perguntamos. Qual era o número do ônibus? Nem ideia. Tentamos perguntar para alguém a nossa volta mas não conseguíamos nos comunicar. Após uns 5 minutos rodando pelo terminal, conseguimos pedir para um motorista qual era o ônibus que tínhamos que pegar pro Rio. Era pôr do sol.

Foram longos 40 minutos até chegar, em que eu e Cambs falhamos em tentar manter qualquer conversa pois toda hora a gente esquecia o que tinha falado. Chegamos no Rio.

Descemos na Glória e combinamos de encontrar o resto do pessoal na Lapa. Andamos até lá, mandamos mensagem e descobrimos que eles foram nos encontrar na Glória. Dessa vez resolvemos ficar parados pra evitar mais desencontros.

Conseguimos encontrar todos. Abraços, cumprimentos e etc. Fomos beber em algum lugar até dar a hora de entrar na festa. Muitas cervejas e catuabas depois, entramos na festa. Logo na entrada, o golpe:

Dobro de caipirinha por 15 reais.

Todos pegamos.

Esse foi o primeiro erro.

Cerca de 10 minutos depois os efeitos já eram sentidos. Cambs estava vomitando no balde de lixo que ficava na escada. Love, o aniversariante, sumiu pra nunca mais ser visto. Toni, o onipresente (sempre que piso no Rio, ele surge de alguma forma), surgiu do nada e da mesma forma que surgiu, sumiu novamente. Havia um quadro do Tim Maia na parede que já estava virando nosso amigo. E ainda tinha o segundo copo de caipirinha pra tomar.

Fomos para o bar pegar o outro copo que tínhamos direito, e eis que surge Dico.

Com Ted.

E papéis mágicos.

Esse foi o segundo erro.

Um quartinho pra você, um quartinho pra ela, um quartinho pra ele. Um quartinho pro Camb... Ele ainda estava vomitando. Eu e Dico rachamos a parte dele.

Hattrick.

A partir desse momento nada mais é linear. A ordem das coisas deixou de existir e viagem estava apenas começando.

Troquei muita ideia com o Tim. Todo canto que eu olhava eu via minúsculos vaga-lumes azuis iluminando todo o local. Todos em volta eram iguais e não tinham expressão, enquanto eu tentava encontrar algum rosto conhecido em um mar de gente ao som de algum rock indie dos anos 10. Eu não sei se o local tinhas dois ambientes diferentes ou se era só na minha cabeça, mas eu ficava vagando entre eles enquanto tentava descobrir onde era o banheiro, ou onde estava meus amigos, o que surgir primeiro.

Foi o banheiro. Quando eu entrei parecia enorme, mas ao sair vi que era minúsculo. Muita coisa vomitada, mas consegui sair de lá ileso. Mas ainda em outra dimensão.

Voltei em minha busca e no meio da multidão vi alguém com uma cabeça gigante. Tipo o piu-piu louco de ácido. Me aproximei e ele foi ficando azul, até que cheguei mais perto e vi o que sempre acreditei que era: era Cambs.

Eu não fazia ideia que tinha uma área de fumantes esse tempo todo, mas feliz que não tinha me perdido de todos. Chegamos lá e já avistei Dico, sem camisa fumando um palheiro olhando pro céu. Já tava muito longe. Peguei o palheiro dele pra ver se ia pro mesmo lugar, enquanto Cambs tomava bronca das mulheres do outro lado da área de fumantes.

Cambs volta de lá com uma cara de envergonhado, mas rindo de si mesmo. De repente ouço alguém gritando:

Tomei até um susto. Como assim? Não tem segurança nesse lugar? As pessoas não tem medo de dar bandeira assim? Isso eu pensei antes de olhar pra ver quem gritou.

Era Ted.

Enquanto dichavava maconha, e trocava ideia com o segurança. O Rio de Janeiro não é para principiantes.

Fumamos, e eu que tava quase voltando, já fui pra casa do caralho novamente. Só fazendo o suficiente pra existir.

Dei uma recuperada e percebi que faltava muita gente por ali. Duas amigas tinham ido embora. Love nunca mais foi visto. X foi visto a última vez vomitando em algum lugar. Fomos procurar ele.

Andamos por todo o local, mas nada dele. Mas encontramos Toni, sentado na escada ao lado de uma poça de vômito. Acordamos ele, que nos seguiu na busca por X.

Nada dele, voltamos pra lá encontrar o resto para sair de lá, o dia tava quase amanhecendo.

Fomos pra fila do caixa, a festa já estava esvaziando. Eu tava todo descaralhado já, doido pra dormir em qualquer canto. de repente uma desconhecida me puxa pra dançar.

Ela riu e me devolveu pro mesmo lugar, enquanto meus amigos riam.

Saímos, pegamos um dogão ali pela praça. Não sei se comi por fome ou por instinto de sobrevivência, mas estava entregue ao piloto automático.

Nessa hora começamos a lembrar que iríamos dormir na casa de Love, que seguia sumido. Dico e Ted conversavam enquanto eu e Cambs tentávamos conversar. Sem sucesso.

Todo mundo entrou num táxi e partimos. Sei lá pra onde, eu dormi assim que a porta fechou.

A cabeça latejava de dor, a boca implorava por gotas de água e o pensamento já não sabia o caminho de casa, mas alguém resolveu me acordar.

Olhei ao meu redor. Estava em um quarto com 2 camas e um guarda roupa. Tinha mais um colchão no chão com o corpo de Cambs lá. Dico já tava lá fora e dava pra ouvir um pagodinho rolando. Resolvi levantar.

Cheguei e senti o cheiro da fumaça e o barulho de cerveja abrindo.

Era o pai de Ted, já me oferecendo um copo.

Eles me trataram como se eu fosse da família, comemos um churrasco a tarde toda e bebemos pra recuperar da noite anterior. Eu só tinha ido lá buscar maconha. Quando fomos embora, ele nos deu um copinho de shot do Vasco para cada um.

Love foi encontrado por alguém no banheiro desacordado, a pessoa achou de bom tom pegar o celular dele, ligar para a mãe e dizer que o filho estava morrendo no banheiro de uma festa da Lapa. A mãe dele foi desesperada buscar e foi mó escândalo. Não vimos nada disso.

X se perdeu de todo mundo e resolveu ir esperar o mêtro abrir. Ficou mais de uma hora esperando de lado de fora sendo o que mêtro estava aberto o tempo todo.

Toni segue surgindo e sumindo por ai.