Taxa de Aborrecimento em Cuidados Digitais

Você já sentiu um desconforto quando começa a fazer uma coisa nova? Aquela sensação de “porra, não consigo fazer isso de jeito nenhum”, busca aí na mente a última vez que sentiu isso, captura esse momento, agora pensa em outros momentos e compara. Parece que pra algumas coisas, o nosso desconforto vai ser muito maior do que em outras algumas coisas. Esse desconforto às vezes se soma aos pequenos irritantes, aqueles desafios do dia a dia que deixa a gente irritado. Como não conseguir passar o RioCard de primeira, seja porque a máquina de cartão não leu direito o chip ou porque você fez recarga e recarregou na hora ali. São coisas pequenas, esquecíveis, mas que quando rolam com você, te trazem sensações desagradáveis, em diferentes intensidades. 3 pessoas negras numa cozinha, bem típica no brasil. Geladeira com ímãs. Paninho de rendinha na mesa. Estão conversando e dando risada, enquanto uma mulher negra jovem mexe no computador, com fones de ouvido.

Agora imagina o seguinte cenário, você tentando explicar pra sua mãe que ela precisa botar senha no telefone dela, ela diz pra você que não precisa, que complica mais pra desbloquear a tela. Você insiste, explica novamente, fala sobre um assaltante que se levar o telefone dela e tentar abrir o aplicativo do banco, sem a senha na tela vai facilitar um pouquinho. Ela te responde, mas o aplicativo do banco tem senha, ele não vai acessar, e aí já sem tanta paciência você rebate, mas mãe, tem formas de descobrir a senha do seu aplicativo, sem precisar da senha. Ela encerra a conversa dizendo, então não preciso botar senha na tela, se dá pra descobrir de qualquer jeito, qual a diferença?

Bom, não é bem por aí. Queria parecer confuso no começo desse texto de propósito, pra ilustrar que a gente se aborrece, no geral, as pessoas se aborrecem o tempo inteiro, pra fazer qualquer coisa. Desde ações pequenas que modificam nossa rotina, até grandes passos transformadores de realidade. E com as bugingangas tecnológicas não seria diferente.

Começamos na internet discada, com aqueles grunhidos que saíam das caixas de som durante a tentativa de conexão, após isso passamos para modens de Oi Velox capazes de transportar longíquos 1 megabytes de dados. 5 megabytes hoje em dia não é nem um PDF que você manda pra um colega de trabalho depois do expediente. A internet evoluiu muito. Atualmente passamos em média 9h por dia no celular, segundo estudos, essa é uma das maiores médias de uso do celular do mundo, aqui o Brasil ganha de 7 a 1, em tempo de tela. mulher negra tomando café olhando pra câmera, na mesma cozinha linda da foto anterior.

Repensar a forma como lidamos com essa relação intensa com as telas, é um aborrecimento. Você ousaria ficar 1 mês inteiro sem celular? Imagina o aborrecimento que isso te causaria, na vida pessoal, profissional, familiar, no barzinho de sexta, na feira de domingo, no caminho pro trabalho novo. Esse grau de irritação seria muito alto em um mês inteiro desconectado, mas ele pode ser menor, conforme você diminui o tempo fora, ou melhor, de acordo com novos modos de usar seu celular, você pode se aborrecer menos e aumentar a qualidade da sua relação com as telas. Pode até transformar sua vida celulística num jeito de potencializar sua existência, melhorar sua comunicação, fortalecer seu autocuidado e outras coisas inimagináveis, até porque, enquanto sociedade nunca tivemos boas relações com as máquinas.

Em uma caminhada pelo cuidado da saúde mental, não estar tanto tempo deslizando o dedo pelas telas, pode ser uma boa saída. Principalmente se você é uma pessoa trans nas redes, os dados sobre discurso de ódio à pessoas trans e LGBTQIAP+ são ensurdecedores. Números esses que se multiplicam de uma rede social para outra, são violências que tem como plataformas esses aplicativos e sites de “interação social”. Revisitar seus modos de uso dos celulares, pode te deixar mais feliz quando estiver online, mas eu vou torcer pela paz como Jroge Ben Jor, pra que você prefira sempre ficar offline, se puder e se quiser.

A tudo isso, essa irritação digital e a necessidade de se proteger digitalmente, temos uma coisa no meio do caminho, a nossa taxa de aborrecimento, [taxa de aborrecimento] nas novas tecnologias, [taxa de aborrecimento] nas novas ferramentas, [taxa de aborrecimento] nas novas práticas. Mas como pra tudo temos [taxa de aborrecimento], tipo quando queremos deixar o sedentarismo de lado, correr um pouco por dia, mas só por 5 minutos, pra não ficar pesado. Pra quando queremos dormir cedo, mas meia noite tá bom, depois eu vou dormindo mais cedo se conseguir. Sempre criando nossos meios de diminuir nosso aborrecimento, nosso desconforto fatídico ao mudar de vida. Ao cuidar de si mermo, a botar nossa saúde como prioridade ou simplesmente, querer mudar um pouco, porque mudar é importante.

A taxa de aborrecimento, vai estar presente em tudo que puder fazer a sua vida diferente, pra melhor, ou pra pior. Por isso é importante estar atento a ela, tomar cuidado. Porque ela também indica se essa mudança vai valer a pena pra gente, tem mudanças mais dolorosas que outras, que nossa taxa de aborrecimento vai beirar o infinito, mas que podem nos salvar a vida. Outras modificações dolorosas, podem mexer em nossa tolerência pelo aborrecimento, mas podem verdadeiramente estar acabando com a gente, e talvez é preciso recuar nessa, rever, repensar, desfazer, recomeçar. Na tecnologia é por aí, se um dia te falarem que seu celular ouve suas conversas, dê uma refletida, consigo me cuidar disso? Preciso me cuidar disso? Posso aprender como, preciso saber se quero.

A proposta dessa coluna, minha família, é apresentar a vocês possibilidades de cuidados digitais, celebrar o que vocês já sabem desse mundo-maluco-tecnológico, engrandecer suas dúvidas, pra gente lidar com elas, deixar nossa taxa de aborrecimento curta e aceitável. Enfrentar o medo desse tanto de nomes em inglês que mexem com nossa vida cada vez mais. Eu quero mostrar como me cuido, e contar as histórias do que tenho aprendido falando sobre isso por onde ando, seja na minha comunidade em Imbariê, no complexo da Maré, no Muquiço em Guadalupe ou lá em Belém do Pará. Caminho pelo mundo nessa missão, mas parto da Baixada Fluminense, e é pra cá que retorno tudo que construo. Quero construir com vocês.

Podem me chamar de Ramires, O Tecnorgânico. A parte orgânica vem depois. homem negro agachado ao lado de uma lixeira escrita “orgânico”