Sobre consentimento (e um pouco de BDSM)

(talvez esse texto possa servir de gatilho pois contém menção à estupro)

Iniciei minha vida sexual aos 16 anos mas só fui entender de fato do que se trata esse tal consentimento aos 23 numa relação BDSM. Os 5 anos iniciais dessa vida sexual foram sem ter um orgasmo. Só conseguia sozinha e nunca entendia o porquê. E isso me incomodava bastante e me intriga até hoje. Acredito que faltou um pouco de conhecimento sexual: entender o que curtia e entender sobre consentimento. E também faltava um pouco de paciência por parte das pessoas que fiquei, principalmente os homens.

Muito desse sexo ruim se deve ao fato de eu achar que precisava agradar, satisfazer a pessoa, independente se isso custasse o meu prazer. Se o outro está satisfeito, então estou satisfeita. Não conseguia falar não. Se a pessoa queria tentar isso ou aquilo eu topava para agradar, por mais que não tivesse vontade. Tinha medo de negar e a pessoa achar ruim, tentar me forçar a algo ou, quando era alguém que gostava, da pessoa “desistir” de mim. E, até então, as duas únicas vezes que tentei negar acabei sendo forçada a fazer algo que não queria.

Aos 23, mais madura e numa relação BDSM, fui introduzida ao que seria esse consentimento. Diferente de certos livros/filmes, não precisamos assinar contrato, bastou apenas conversar. Coisa que fazemos até hoje, com quase 9 meses de relação. Bastou ambos terem paciência e entender o que o outro deseja, sem julgamentos e insistências. E não só conversar antes do ato sexual, mas durante também. No início parecia esquisito ele parar o sexo e me perguntar como estava sentindo, se estava gostando ou se queria que parasse (claro que na medida que nos conhecemos, a necessidade de perguntar diminuiu). O máximo que tinha no sexo eram os gemidos e alguns palavrões, as vezes nem isso. Para alguns homens parecia que gemer iria contra a sua masculinidade. E nessa relação, por mais submissa que seja, tenho o poder de parar a hora que quiser.

BDSM é muito mais complexo que só apanhar e bater. É também identificar sinais, ter atenção ao outro e se preocupar com o prazer desse outro. É saber quando parar. O consentimento é isso, muito mais que um explícito “não”. Quando existe consentimento, você se sente valorizada e à vontade para dizer “não” em vez de ter medos. Você sente confiança em experimentar coisas novas porque sabe que mesmo se for ruim, o seu companheiro ou companheira vai entender e não insistir naquilo. Se você está se relacionando com alguém que não entende seus sinais e não sabe a hora de parar, talvez você deva repensar essa relação.

Não é só porque você acabou de transar com a pessoa e não quer um “segundo round” que ela tem que insistir e as vezes forçar a continuar. Se forçar, é estupro. Se o cara tira a camisinha na hora do sexo sem o seu consentimento, é estupro. Se você está sem condições de dar um consentimento à outra pessoa e mesmo assim ela tenta/conclui o ato sexual, também é estupro. Se você está numa situação que sente medo do que o outro pode fazer e “cede” à relação sexual, é estupro.

Eu não imaginava que sexo envolvia tudo isso. Achava que era como nos filmes pornô: a mulher fica numa posição confortável pro homem, ela chupa ele até cansar, então ele mete e goza. As vezes chupa ela, mas bem rápido pra não estragar o prazer dele. E ter isso na vida real, só serve pra objetificar ainda mais a mulher. Muito desse sexo ruim que tive, vinha acompanhado de um imenso sentimento de insatisfação misturado com objetificação depois do sexo. E isso não pode ser considerado normal. A gente tem que se conhecer, não só pra saber o que gosta e exigir isso do parceiro ou parceira, mas pra ser atenta e evitar ter experiências ruins iguais as que tive.